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PIB ou CIB? O porquê e quais as consequências

Modelos e teoremas se não condizem com a realidade provavelmente estão errados e devem ser corrigidos, ou descartados… Foi baseado neste princípio que comecei a analisar com mais escrutínio o pensamento econômico corrente e vários de seus índices e modelos.

Como conseqüência destas análises mais minuciosas cheguei a conclusão que a maior parte do pensamento econômico corrente não tem uma base sólida (1º artigo desta série), e que vários dos seus indicadores não são confiáveis (2º artigo desta série)… O principal exemplo é o PIB, que deveria ter uma forte correlação com os dados sociais, mas como foi demosntrado no artigo anterior, têm pouca. E se bons dados sociais, produção e riqueza têm de fato uma correlação forte e direta, como pode ser observado na realidade, então o PIB não deve estar medindo nem a produção interna de um país, e muito menos a sua riqueza… Mas, então, o que o PIB está medindo?

Para respodermos a essa pergunta precisamos saber os métodos de cálculo do PIB. São três as formas de calcular o PIB, pelo método da produção (mas que também utiliza um pouco o consumo), pelo método das rendas e pelo método do consumo. Como o cálculo do PIB pelos três métodos têm que dar valores iguais, ou quase iguais, pois eles foram construídos para serem equivalentes entre si, decorre que se um dos métodos for comprovadamente errado, os outros dois, por conseqüência , também serão. Logo, para facilitar o meu trabalho escolhi atacar o cálculo do PIB pelo método que considero ser o mais fácil para essa empreitada, o método do consumo, abaixo segue um modelo ilustrativo e sua fórmula de cálculo.


Y = C + I + G + (X-M)

Y =PIB, C= Consumo, I=Investimentos, G=Gastos do Governo, X=Exportações e M=Importações

Segue do modelo e da fórmula que o cálculo do PIB por este método não é feita de forma direta, pela soma dos vários produtos feitos no país em um ano, mas indiretamente pela soma dos vários produtos consumidos neste período. E para mim, atualmente, é este último o que o PIB está medindo, o consumo, e não a produção.

Os criadores do PIB assumiram que você só pode consumir o que você produz, e para uma economia fechada isso a grosso modo é verdadeiro, mas para isso ser verdadeiro também numa economia aberta eles tiveram que assumir que desbalanceamentos entre importações e exportações sejam temporários e auto-corrigíveis, ou como pode ser observado no modelo apresentado acima, vazamentos de um determinado país com o resto do mundo seriam, num futuro próximo, compensados por vazamentos do resto do mundo com este país. À época em que o PIB foi criado esta assunção não estava errada, pois as moedas dos países em geral tinham lastro, o mundo encontrava-se no padrão ouro, portanto desbalanceamentos sejam sob a forma de uma conta corrente muito negativa ou muito positiva eram corrigidos por desvalorizações ou apreciações das moedas, gerando retornos a contas externas mais equilibradas  e reajustes nos tamanhos dos PIBs. Infelizmente não é isso o que está acontecendo, estes ajuste estão demorando demais,  quando ocorrem as correções são muito exacerbadas, e em alguns casos não ocorreram desde que esses desbalanceamentos começaram a aparecer a algumas décadas atrás…  Se você for analisar as contas correntes dos vários países que compõem o mundo atual, um cenário bem peculiar se desdobra…

Até o começo do século passado, com excessão das colônias, o mundo era composto por países com contas externas mais equilibradas, entretanto o mundo atual, pós anos 70, é um mundo bastante diferente, composto por alguns países quasi-permanentemente superavitários como o Japão, China, Coréia do Sul, Taiwan, Cingapura, e Alemanha pós-euro, e outros quasi-permanentemente deficitários, dentre eles,o mais importante e relevante para entendermos porque o mundo de hoje está assim é os EUA, a explicação do porque será dada um pouco mais abaixo, na metade final do artigo… E, com estas condições não podemos igualar consumo interno com produção interna, primeiro porque a maior parte do consumo interno que excedea produção interna dos países deficitários é composta por bens de consumo e não bens de capital/investimento, segundo porque esses excedentes estão sendo adquiridos em sua maior parte através de empréstimos, terceiro porque sendo estes empréstimos externos utilizados para financiar o consumo interno (boa parte com cunho eleitoral), e não investimentos, eles não gerarão produção futura, provavelmente não serão pagos e não possibilitarão um retorno a uma balança mais equilibrada, quarto porque importações e exportações são assimétricas, enquanto as exportações adicionam ao valor do PIB as importações que deveriam subtrair também podem adicionar, se o preço de venda for mair que seu custo de importação, o qualnormalmente é, e quanto maior for esta diferença mais o PIB será inflado, e quinto porque apesar de um país poder estar com as contas internas e externas bem ruins, ainda assim ele pode estar com seu poder de compra excessivamente alta (Brasil de 1994), dependendo da taxa de câmbio que o mercado estabelecer. Vale lembrar que essas taxas são determinadas, a curto e médio prazo, pela oferta e demanda, que podem e são muito manipuladas por vários agentes que atuam no mercado, e não pelos fundamentos da economia como é propagandeado, mais explicações sobre este tema serão abordados em artigos futuros.

Quando você está calculando o PIB de um país você está fazendo algo análogo a uma reengenharia reversa de uma empresa. Você está tentando descobrir sua receita através da soma de seus custos, investimentos e lucros ou prejuízos. Voltando a fórmula apresentada anteriormente temos:

PIB = C + I + G + (K-M)

PIB=Receita/Vendas, C=Gastos Diversos, I=Investimentos, G=Impostos,(K-M)=Lucros, Prejuízos

Ou seja, o PIB é o equivalente a receita na DRE (demonstração do resultado do exercício) de uma empresa, mas quando análisamos a saúde financeira de uma empresa não olhamos só a DRE, mas também o DFC e o Balanço Patrimonial, o DFC não faz muito sentido em termos de países, mas o BP, que é para onde os lucros e prejuízos vão e aonde está o endividamento e os ativos, faz,e muita, até porque mais cedo ou mais tarde a situação do BP de um país vai pesar sobre o câmbio e a vida da população, e para mim a mesma máxima para uma empresa, neste caso, vale também para os países, qual seja, a que a receita de uma empresa não é tão relevante quanto o seu lucro.

Outro fator importantíssimo para se entender o mundo atual é a primazia do dólar no mundo, e que esta primazia não tem necessariamente a ver com o tamanho e o dinamismo da economia americana, mas sim com fatores históricos.

Porque o dólar é tão importante? Pra responder esta pergunta primeiro precisamos saber as três formas que o governo têm para se financiar, impostos, endividamento e inflação (impressão de dinheiro), ou seja, enquanto nós precisamos obter reais via troca (de produtos ou trabalho) ou endividamento para podermos consumir, o governo só precisa imprimir (e se quiser tomar empréstimos pagará a taxa de juros mais baixa do mercado por ter este privilégio autoconferido), agora vamos expandir esta dinâmica em termos de países, se o Brasil quiser comprar celulares da China, precisará de dólares, e da mesma forma se a China quiser comprar soja do Brasil ela também precisará de dólares, ambos os países precisarão vender algo ou obter empréstimos para conseguir estes dólares, e isto é verdade para quase todos os países do mundo, com exceção de um, os EUA… Como o mundo está no padrão dólar, os americanos podem simplesmente imprimí-los (e eles utilizaram bastante desta prerrogativa, TARP,QE1, QE2, Operation Twist, QE3, etc…), e isso dá uma força e relevância extraordinária aos EUA.

Os principais fatos históricos que levaram o dólar a ser a moeda de reserva do mundo foram, a vitória dos EUA na 2º Guerra Mundial, e a excessiva concentração do ouro do mundo nas mãos dos americanos,como conseqüência dos grandes superávits provenientes das duas grandes guerras mundiais. O acordo de Bretton Woods após o final da 2º Guerra, que vinculou todas as moedas ao dólar, e o dólar ao ouro, antes deste acordo cada moeda era diretamente lastreada ao ouro, às vezes a prata também, depois dele todas as moedas passaram a ser indiretamente lastreadas ao ouro via dólar. A quebra do vínculo entre dólar e ouro no governo Nixon, conseqüência de excessivos gastos como a Grande Sociedade de Lyndon Johnsone as guerras da Coréia e do Vietnam, ou seja, todas as moedas passaram a ser fiat (sem lastro)e a capacidade de expansão monetária no mundo explodiu. A revinculação do dólar, mas desta vezao mercado de petróleo (que levou ao surgimento do petrodólar), através de um acordo costurado entre Henry Kissinger e a casa de Saud, no qual os Sauditas só negociariam petróleo em dólares, o que forçou a Opep a também adotá-lo, e em troca os EUA venderiam armas e defenderiam militarmente a Arábia Saudita. A reconstrução da Europa, e a ascenção do Leste Asiático aumentado a demanda por petróleo e dólares, e expandindo exponencialmente a produção de bens de consumo, contrapondo um efeito deflacionário a inflação causada pelos déficits crescentes  dos EUA. Por último a globalização dos mercados financeiros que possibilitaram a esterelização e distribuição de grande parte dessa expansão monetária via mercado de dívidas e operações de carry-trade (arbitragem de juros).

De maneira bem mais sucinta podemos resumir este falatório todo da seguinte forma: No mundo de hoje, países deficitários estão financiando seu PIB (consumo interno) via empréstimos externos de países superavitários (acessados internamente pelo mercado de títulos e operações de carry-trade), e quem tornou isso possível foram os EUA com a implantação do dólar como moeda de reserva através do mercado de petróleo, e isso permitiu os EUA a cobrar um imposto inflacionário sobre o resto do mundo, inflacionando seu PIB, e também tornou possível países muito deficitários e muito endividados a continuar se endividandoe países muito superavitários ecom bastantes ativos no exterior a acumular cada vez mais ativos sem valorizar excessivamente sua moeda (fator que facilita muito essa acumulação excessiva de ativos), portanto um melhor indicador que o PIB para se saber a riqueza de um país é o desempenho de sua conta corrente e o saldo acumulado ao longo do tempo.

Sei que essa visão de mundo vai de encontro ao que a mídia main-stream e o que a maioria dos economistas pregam, não descarto a possibilidade de estar totalmente equivocado, mas essa mesma linha de raciocínio me permitiu antever o que viria a acontecer com o Brasil alguns anos antes que a crise que está assolando o país chegasse, mais pra frente escreverei um artigo explicando esse raciocínio… E, a mesma lógica que me levou a essas visões de mundo também me permite abstrair o que pode vir a acontecer num futuro próximo, e se o que vou delinear a seguir acontecer, creio que o cenário que expus até aqui não estará tão longe da realidade, até porque o que acho que vai acontecer não é nada convencional…

Se não houver uma conflagração mundial, nos próximos anos (o timeframe que estou trabalhando é de mais ou menos 10 anos, é muito difícil colocar uma data exata, pois como já foi assinalado várias vezes, os inputs (dados) que você tem que trabalhar são muito ruins, mas acho difícil que esse fato ocorra muito depois do segundo mandato de Donald Trump ou do primeiro mandato do próximo presidente se for um democrata), eu acredito que o dólar deixará de ser moeda de reserva e a economia americana irá implodir. 

Vários governos e governantes compartilham de uma visão parecida com a exposta acima e estão determinados a mudar esta ordem econômica, o ex-presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, já comentou que o poderio americano está no dólar, assim como o atual presidente da Rússia, Vladimir Putin e o governo Chinês do premier Xi Jinping. Os Sauditas mais recentemente fizeram uma ameaça velada ao dólar, a qual foi prontamente negada após uma repreensão mais dura por parte dos americanos. Tanto os governos Russo e Chinês estão desenvolvendo uma alternativa ao SWIFT, sistema mundial de transferência eletrônica bancária, muitas vezes utilizada como arma econômica contra regimes considerados hostis pelos EUA. A China esta desenvolvendo um mercado futuro de petróleo com liquidação em yuan e resgatável em ouro. A Rússia vendeu praticamente todas as suas treasuries e as substituiu por ouro, e continua a fazer grandes aquisições do metal precioso para suas reservas, a China de maneira mais discreta parece estar seguindo o mesmo caminho. Vladimir Putin está tentando reorganizar a geopolítica do petróleo e até o momento parece que está sendo bem sucedido, por sua vez a China está tentando costurar um grande acordo entre os países que compõem a ASEAN para substituir o dólar pelo yuan em suas transações comerciais, por fim, como consequência da guerra comercial, a China também está ameaçando vender todas as suas treasuries (títulos da dívida dos EUA). 

Ou seja, o que venho observando nos últimos anos, é que parece estar ganhando força um movimento muito forte contra o dólar, mas mesmo que essas forças externas não consigam ganhar corpo suficiente para levar um abandono do dólar como moeda de reserva, acho que isso também poderá vir por uma crise interna, que para mim parece muito mais próxima do que a maioria dos profissionais do mercado estão percebendo. 

Os EUA estão com juros bem abaixo do valor de equilíbrio a mais de dez anos, inúmeros malinvestments devem ter ocorrido, afinal o que é consumir com endividamento senão um investimento com retorno negativo garantido? E, lembrando que com todos os produtos que o governo forçou seu preço abaixo de seu preço de equilíbrio a consequência foi um excesso de consumo seguida por uma escassez do mesmo, tanto maior quanto maior foi a sua manipulação… Será que isso nãopoderá acontecertambém com a poupança depois de tantos anos de manipulação de seu preço de equilíbrio (taxa de juros) pelo Fed?

Uma consequência já visível de toda essa manipulação das taxas de juros é que quase todos os fundos dos estados americanos estão descobertos, e várias cidades e estados estão super-endividadose com sérias restrições orçamentárias. Outra é que o nível de endividamento das empresas nunca estiveram tão altas e muitas só não foram rebaixadas a nível de junk bond por “boa vontade”  das empresas de avaliação de risco, e para dar o coup de gracê, os juros baixíssimos criaram bolhas em quase todos os ativos financeiros, desde títulos e imóveis à ações e obras de arte.

Por fim um novo catalisador acabou de ser jogado no cenário americano que terá repercursões por muitose muitos anos, e acredito que tem apenas uma pessoa capaz de usá-lo para tentar reverter ou pelo menos estancar todo este processo, essa pessoa é o oposto de Donald Trump e será assunto do próximo artigo…

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